Ligação Sombria

Ligação Sombria

Sinopse (imdb): Um motorista se encontra em um jogo de gato e rato de alto risco depois de ser forçado a dirigir para um homem misterioso conhecido como O Passageiro.

Dirigido por Yuval Adler, Ligação Sombria (Sympathy for the Devil, no original) usa aquele formato de poucos personagens, poucos cenários e muitos diálogos, onde aos poucos vamos montando o quebra cabeças com as peças que o roteiro nos dá. Quase o filme inteiro tem apenas dois personagens, quase o filme inteiro se passa em dois cenários (dentro do carro ou no restaurante). Um homem está indo ao hospital porque sua mulher vai dar à luz, mas outro homem armado entra no carro e o obriga a irem para outro lugar. Inicialmente vemos um sequestrador e um sequestrado, e ao longo do filme precisamos descobrir o que cada um esconde.

Ligação Sombria tem uma coisa muito boa e outra que me desagradou bastante. Vamos ao ponto positivo: Nicolas Cage. De um tempo pra cá, Cage virou um adepto do “over acting”. O cara quase sempre exagera nas suas atuações. E quando o filme sabe usar isso a seu favor, o resultado é muito bom. E isso acontece aqui. Cage está exageradíssimo, em algumas cenas ele parece completamente alucinado. Se existe um bom motivo para se assistir a Ligação Sombria, este motivo é Nicolas Cage.

Agora, conforme vamos descobrindo o que é cada personagem, o filme vai enfraquecendo, porque são personagens que tomam atitudes incompatíveis. Vou fazer um comentário, mas antes, aviso de spoilers.

SPOILERS!
SPOILERS!
SPOILERS!

No fim do filme descobrimos que o sequestrado matou a mulher e a filha do sequestrador, então isso seria uma jornada de vingança. Mas, se a vingança é contra o sequestrado, por que matar o policial e deixar o sequestrado vivo? Pior ainda: por que fazer aquela “queima de arquivo” no restaurante e matar o cozinheiro – e deixar o sequestrado vivo???

FIM DOS SPOILERS!

Enfim, só vale pra quem curte o Nicolas Cage alucinado.

A Substância

Crítica – A Substância

Sinopse (imdb): Uma celebridade em decadência decide usar uma droga do mercado negro, uma substância que replica células e cria temporariamente uma versão mais jovem e melhor de si mesma.

A ideia aqui era boa: uma estrela de um programa de fitness na TV está ficando velha, então oferecem a ela uma misteriosa substância que criaria uma nova versão dela, mais jovem. Essa substância vem com regras estritas, que claro que não serão seguidas, e claro que coisas vão dar errado. Uma bela crítica à exploração do corpo feminino pela mídia e ao etarismo.

É um filme fantástico, essa tal substância não tem nada ligado à ciência, não existe um laboratório ou uma clínica ou acompanhamento de médicos. Não tem nem uma cobrança financeira pelo tratamento! Aliás, fiquei pensando, se heu recebesse um daqueles kits, heu não saberia fazer aquela auto-aplicação.

A direção e o roteiro são de Coralie Fargeat, que em 2018 fez Vingança, filme que tinha uma premissa simples mas muito bem executada (uma mulher é estuprada e se vinga de seus agressores). Aqui é outra pauta feminista, mais uma vez muito bem executada.

Todo o visual do filme é muito bom. Cores, ângulos de câmera, edição, trilha sonora, efeitos sonoros, tudo carrega a trama num modo hipnotizante – são duas horas e vinte minutos de filme que fluem muito rápido. De quebra o fã de terror ainda vai encontrar várias referências, como a seringa de Re-Animator, o corredor de O Iluminado, os alienígenas de Bad Taste, o monstro de O Enigma de Outro Mundo, o banho de sangue de Carrie a Estranha

A Substância (The Substance, no original) traz diversas cenas visualmente bem desagradáveis, seja mostrando ferimentos, seja quando um personagem simplesmente mastiga a sua refeição (lembro de uma cena parecida em Vingança, Coralie consegue transformar o simples mastigar em algo nojento). A maquiagem é um dos destaques, usando o chamado “body horror”, que é quando vemos imagens que causam repulsa. Talvez isso afaste parte do público, mas, é algo que faz parte da história.

Mas acho que o maior destaque são as duas atuações principais. Tanto Demi Moore quanto Margaret Qualley estão ótimas! Demi Moore estava meio sumida, e heu diria que esse papel tem tudo a ver com ela, que era uma das mulheres mais bonitas da sua geração, e agora, com 61 anos (continua linda, diga-se de passagem), deve estar enfrentando problemas semelhantes aos de sua personagem.

Aliás, foi uma atuação, digamos, corajosa da Demi Moore, que faz várias cenas onde ela está nua – e não é nudez gratuita, se ela estivesse vestida, seriam cenas estranhas (assim como a sequência final de Vingança, onde o ator está completamente nu num longo plano sequência).

O principal papel masculino é de Dennis Quaid, que está caricato, mas todos os personagens masculinos aqui são caricatos. Faz parte da proposta. (Esse papel seria de Ray Liotta, que faleceu antes das filmagens começarem. Seu nome aparece nos créditos como uma homenagem.)

Não gostei da parte final. Vou falar, mas vou colocar aviso de spoilers.

SPOILERS!
SPOILERS!
SPOILERS!

A protagonista gera uma cópia. No fim do filme, a cópia está se deteriorando e resolve fazer uma cópia da cópia, e isso gera um monstro. E essa versão monstruosa vai para o estúdio de TV e entra no programa ao vivo. Pra mim, essa parte do estúdio enfraqueceu o filme, nunca deixariam ela entrar na transmissão ao vivo daquele jeito. Ok, vira um banho de sangue, isso foi legal de ver, mas, essa sequência destoou do que a gente tinha visto até então. Por mim, era melhor cortar toda a parte do estúdio, e deixar só o finzinho – a cena final é boa.

FIM DOS SPOILERS!

Filmaço. A Substância é daquele tipo de filme que fica na sua cabeça por dias depois de ter visto. Agora quero esperar estrear pra poder rever.

Pisque Duas Vezes

Crítica – Pisque Duas Vezes

Sinopse (imdb): Quando o bilionário da área de tecnologia Slater King conhece a garçonete Frida em sua festa de gala para arrecadar fundos, ele a convida para se juntar a ele e seus amigos em férias de sonho em sua ilha particular.

Pisque Duas Vezes (Blink Twice) é o filme de estreia como diretora da atriz Zoë Kravitz (Batman), filha de Lenny Kravitz e Lisa Bonet (ela também é co-autora do roteiro). E podemos dizer que ela mandou bem em sua estreia.

Pisque Duas Vezes é daquele tipo de filme onde vemos uma situação aparentemente normal acontecendo em primeiro plano, mas tem algo muito estranho escondido em segundo plano, algo que será revelado em um plot twist – ouvi comparações com Corra e Não se Preocupe Querida. Sim, é daquele tipo de filme que precisamos prestar atenção nos detalhes!

Falei que a Zoë Kravitz mandou bem, né? Pisque Duas Vezes é muito bem filmado. Muitos closes, várias imagens subliminares jogadas estrategicamente, cada take parece muito bem pensado e muito bem filmado. A edição é cheia de detalhes, elementos soltos jogados aqui e ali, que vão se juntar num grande quebra cabeças final. A trilha sonora também é boa.

Pisque Duas Vezes traz algumas cenas bem violentas na parte pós plot twist, mas não entrarei em detalhes por causa de spoilers. Aliás, recomendo que vocês fujam de spoilers!

Assim como acontece frequentemente em filmes dirigidos por atores, Pisque Duas Vezes tem um ótimo trabalho com o elenco. O filme é estrelado por Naomi Ackie, não conhecia a atriz, e ela manda muito bem. Channing Tatum esta sensacional, num papel bem diferente do que costuma fazer. Adria Arjona também surpreende, num papel que parecia superficial mas se mostra bem mais complexo. E o filme traz vários atores conhecidos que não são “de primeira linha”, como Christian Slater, Haley Joel Osment, Geena Davis e Kyle MacLachlan. Também no elenco, Alia Shawkat, Simon Rex, Trew Mullen, Liz Caribel e Levon Hawke (sim, irmão da Maya Hawke).

Não gostei do final, do que acontece na cena final. Não estraga o bom trabalho da Zoë Kravitz, quero ver seu próximo filme como diretora, mas, acho que aquela cena final ficou um pouco deslocada.

Armadilha

Crítica – Armadilha

Sinopse (imdb): Um pai e sua filha adolescente assistem a um concerto pop, onde percebem que estão no centro de um evento sinistro.

Antes de tudo, preciso dizer que rolava um pé atrás. M Night Shyamalan esteve no Brasil para divulgar o filme, mas Armadilha (Trap, no original) não teve sessão de imprensa. Quando isso acontece, normalmente é sinal de que não acreditam no sucesso do filme e estão querendo evitar críticas negativas. Mas, preciso dizer que achei um erro da assessoria. Armadilha não é ruim, tem filmes muito piores que ganham sessões de imprensa.

Vamos ao filme. Claro que Armadilha estava no meu radar, vi todos os filmes do Shyamalan quando lançados no cinema, mesmo os ruins, reconheço que gosto do estilo dele. Claro que queria ver seu novo projeto. Shyamalan disse que seu filme seria “e se O Silêncio dos Inocentes acontecesse dentro de um show da Taylor Swift”?

Armadilha parte de uma proposta interessante. É um filme de serial killer, mas pelo ponto de vista do assassino. Acompanhamos o protagonista em um “momento família”, quando ele vai levar a filha adolescente a um concerto de uma artista pop. E, dentro do estádio, ele descobre que caiu numa armadilha e o local está cercado de centenas de policiais atrás de um homem com o perfil igual ao dele.

Armadilha tem pelo menos dois grandes méritos. Um deles é a atuação de Josh Hartnett. É um personagem complexo, porque ele precisa alternar em segundos entre ser um pai dedicado e amoroso, e um assassino frio e calculista. E Hartnett consegue passar todas as nuances que um personagem desses tem.

Outra coisa que achei impressionante foi a parte musical, a cargo de Saleka Shyamalan, filha do diretor. Todas as músicas da Lady Raven foram compostas por ela, e é ela cantando. Não que sejam músicas sensacionais, não é exatamente o meu estilo, mas reconheço que ela fez um excelente trabalho criando essa diva pop fictícia (provavelmente existe um álbum com todas essas músicas que estavam no show dentro do filme). Vendo o filme, dá pra acreditar que a Lady Raven é uma artista real.

É filme do Shyamalan, claro que tem algumas características comuns em seus filmes. Vou citar um ponto positivo e um negativo que quase sempre estão presentes. O positivo é a câmera, gosto do modo como ele posiciona e movimenta a câmera, como aquela cena onde o Cooper vai ao banheiro, a câmera se aproxima lentamente enquanto ele vai até a cabine, e depois o jogo de câmera pra mostrar ao espectador que ele sempre está vendo a mãe. Também rola, mais de uma vez, um close no rosto de Josh Hartnett com a cara pela metade, no canto da tela. Por outro lado, o ponto negativo é ter explicação demais, como a cena onde falam que a mulher do FBI é a chefe da operação, a gente já sabia aquilo tudo. Ou alguns diálogos na parte final que ficaram tão cheios de detalhes que soam artificiais.

E, claro, tem algumas facilitações de roteiro comuns em filmes assim. Tipo, tudo o que o protagonista tenta fazer pra escapar dá certo. A gente até aceita que ele seja um cara meio “sabonete”, mas algumas cenas ficaram meio forçadas. E teve uma coisa que pensei: entendo que é um estádio cheio, mas, centenas de policiais estão procurando um homem de 40 e poucos anos em um show onde a grande maioria é de meninas adolescentes. E quando vemos a plateia, Hartnett é MUITO mais alto do que todos em volta dele. Ok, muita gente, vários outros suspeitos, mas… Ele estava muito exposto…

Mesmo assim, gostei do resultado final. Shyamalan consegue manter a tensão até o fim, quando o filme toma uns rumos que, pelo menos pra mim, foram completamente inesperados, e começa a fechar o cerco em volta do herói / vilão.

Por fim, uma coisa que acredito que não seja spoiler, mas… Assim como seu filme anterior, Batem À Porta, Armadilha não tem nenhum plot twist bombástico. Acredito que tem gente que vai se decepcionar com isso…

Tem uma “cena pós créditos” que na verdade fica no meio dos créditos. É uma cena boa, bem engraçada, o que é curioso, porque não me lembro de ter rido nenhuma vez ao longo do filme, só nessa cena.

MaXXXine

Crítica – MaXXXine

Sinopse (imdb): Na década de 1980, em Hollywood, a estrela de cinema adulto e aspirante a atriz Maxine Minx recebe sua grande chance. Mas conforme um assassino persegue as estrelas de Hollywood, um rastro de sangue ameaça revelar o passado sinistro dela.

Estreou o aguardado terceiro filme da trilogia X!

Em 2022 Ti West lançou X, um bom slasher com cara de anos 70. Poucos meses depois, tivemos Pearl, um prequel, contando a história da velhinha do filme anterior. MaXXXine é o filme que segue a história de X. Ou seja, é bom ter visto Pearl, mas é essencial ter visto X.

Antes de tudo, preciso dizer que MaXXXine é um bom filme, mas achei o mais fraco dos três. Mas reconheço que parte dessa conclusão é head canon. Porque fui ao cinema esperando ver um terror slasher, e MaXXXine é mais um suspense tentando emular Brian de Palma do que um filme de terror – só vemos três mortes em tela! MaXXXine tem muito menos mortes, nudez e sexo do que X.

Mas, por outro lado, tiro o meu chapéu para Ti West com a sua concepção de trilogia. Em vez de fazer “mais do mesmo”, que é o que a maior parte do público esperava (não me lembro qual filme dizia que uma continuação de filme de terror apenas precisa se preocupar sem ter mais mortes e mais violência gráfica), Ti West criou três filmes distintos, com propostas diferentes. X parece um slasher filmado nos anos 70. Já Pearl tem outro ritmo e parece ter sido feito nos anos 40 ou 50 (peço desculpas, conheço pouco do cinema dessa época). MaXXXine parece um suspense policial filmado nos anos 80. Sim, é a mesma personagem do primeiro filme, mas são filmes completamente diferentes nas suas propostas.

(Lembrei de A Morte te Dá Parabéns, que tem uma continuação completamente diferente do primeiro filme.)

Nesse sentido de ambientação nos anos 80, palmas para Ti West. Tudo aqui emula os anos 80, não só os óbvios figurinos, penteados e trilha sonora. O filme realmente parece ter sido feito naquela época. Segundo o imdb, a produção procurou equipamentos e câmeras usadas nos anos 80, e evitaram “truques modernos” durante as filmagens.

MaXXXine é recheado de referências a outros filmes. Quando sair no streaming, devem pipocar alguns vídeos no youtube tipo “10 referências que você não reparou em MaXXXine!”. Algumas estão muito na cara, como o Kevin Bacon de terno claro e curativo no nariz, igual ao Jack Nicholson em Chinatown; ou citarem Marilyn Chambers, que era atriz pornô e fez um filme de terror em 1977, Rabid, dirigido por David Cronenberg. Outras são menos óbvias, teve uma que comentei com alguns amigos depois da sessão e ninguém tinha reparado. Tem uma cena em uma boate que lembra muito Dublê de Corpo, e está tocando uma música muito parecida com Relax, do Frankie Goes to Hollywood (música usada no Dublê de Corpo). Aguardei até os créditos e confirmei: é outra música do Frankie Goes to Hollywood. Ti West provavelmente usou a mesma banda pra fazer mais uma referência.

(Aliás, em alguns momentos vemos a tela dividida, justamente como Brian de Palma costumava fazer.)

O elenco tem muito mais star power do que os anteriores (X tinha a Jenna Ortega, mas antes do hype de Wandinha). MaXXXine conta com Elizabeth Debicki, Giancarlo Esposito, Kevin Bacon, Michelle Monaghan, Sophie Thatcher, Bobby Cannavale, Halsey e Lily Collins, além, claro da Mia Goth, que, mais uma vez, está muito bem no papel – logo no início, na audição para o papel, ela já mostra que é muito boa. Ah, não sei vocês, mas toda vez que o Kevin Bacon aparecia, heu achava que era o Ethan Hawke.

Sou poucas mortes, mas temos uma violência gráfica bem forte. Diria que tem uma cena em particular onde não morre ninguém que é a mais forte de todas, que é quando Maxine se defende de um agressor atacando suas partes íntimas. Essa cena vai dar o que falar!

Agora, vamos ao principal problema do filme. Quando X acaba, policiais encontram uma câmera no meio de vários cadáveres. MaXXXine se passa seis anos depois, a Maxine Minx hoje é uma estrela pornô. Mas ela estava nas filmagens encontradas, e todas as outras pessoas que aparecem nas filmagens morreram. Como é que não teve uma investigação policial sobre isso? Como é que conseguiram abafar um caso desse porte? MaXXXine dá a entender que existe alguém poderoso por trás, mas se essa pessoa é tão poderosa a ponto de apagar uma investigação policial envolvendo sete mortos, acho que o roteiro deveria ter deixado isso mais claro. Do jeito que ficou, parece que o que aconteceu no final de X foi algo pequeno e discreto.

Além disso, não gostei do final de MaXXXine. Achei toda aquela sequência mal construída, mas não entro em detalhes pra não dar spoilers.

Mas, mesmo achando MaXXXine um degrau abaixo dos outros dois, podemos dizer que Ti West fez uma boa trilogia. MaXXXine estreia semana que vem, dia 11 de julho, e merece ser visto no cinema.

Os Observadores

Crítica – Os Observadores

Sinopse (imdb): Quando Mina fica perdida em uma floresta na Irlanda ela acaba encontrando três estranhos que são perseguidos por criaturas misteriosas todas as noites.

Estreia na direção da filha do Shyamalan, Ishana Shyamalan. Podemos dizer que ela se parece com pai – no bom e no mau sentido.

Antes de tudo, preciso dizer que a expectativa estava lááá embaixo, porque Os Observadores (The Watchers, no original) não teve sessão de imprensa, e a divulgação estava muito fraca. Normalmente quando isso acontece é porque a distribuidora não acredita no potencial do filme. Aí o filme é mal lançado, fica uma semana em cartaz, em poucas salas, e já sai de cena. Fui checar agora, na segunda semana, são poucas as sessões.

Enfim, sem sessão pra imprensa, não pude ver antes. Atrasado, vamos ao meu texto.

Os Observadores tem alguns problemas comuns em filmes do Shyamalan pai. Um deles é o excesso de explicações, e pior: explicações sem embasamento. Um exemplo de um filme recente dele: em Tempo, os personagens estão em uma praia onde o tempo passa numa velocidade diferente, todos envelhecem muito mais rápido. Isso era o suficiente para o espectador: “o tempo passa mais rápido”. Mas aí resolvem colocar uma cena onde uma personagem dita números exatos sobre a passagem de tempo. Não só isso era desnecessário, como atrapalhou a trama, porque um dos personagens não seguia essa exatidão.

Aqui em Os Observadores, temos muitas explicações. Tem uma personagem que parece que só está ali pra explicar coisas sobre o lugar onde eles estão (e ninguém pergunta como ela sabe de tudo!). E parece que isso não era suficiente, porque determinado momento do filme descobrem gravações que só servem pra explicar tudo ainda mais. Vejam bem, heu não gosto de filmes herméticos onde o espectador precisa procurar textos explicativos depois pra entender o que acabou de ver. Mas, existe um equilíbrio! Não precisa explicar tudo!

E o pior é que essa história é meio sem sentido. Sério, me lembrei de Dama na Água, lembro que o Shyamalan disse na época que ele queria contar histórias de fantasia para os filhos, achei que essa era uma daquelas histórias. Só depois soube que o filme se baseia num livro que já existia, escrito por A. M. Shine – será que no livro a história flui melhor?

Outro problema comum na família Shyamalan é ter personagens que não agem de maneira natural. Assim como em Batem À Porta, último filme do Shyamalan pai, onde os personagens demoram pra verbalizar “o elefante na sala”, aqui a protagonista cai num mundo cheio de regras, mas as pessoas só falam as regras no dia seguinte! Passaram uma noite inteira juntos, e ninguém pensou em explicar a ela como funciona esse local?

A boa notícia é que se Ishana repete alguns defeitos do pai, também repete algumas virtudes. Os Observadores é bem conduzido e o filme mantém um interessante clima de tensão ao longo de quase toda a projeção. Gostei de como o filme começa a desenrolar o mistério (queria falar mais, mas é melhor não, por causa de spoilers).

Falei “quase toda a projeção”, né? Poizé. O final é bem fuén. Talvez pela desnecessária necessidade de criar uma espécie de plot twist, o filme se estica e tem um final que deixa o espectador com gosto amargo na boca ao final da sessão. Caramba, se você não tem um bom plot twist, é melhor terminar o filme antes!

No elenco, Dakota Fanning faz cara de paisagem o filme inteiro, mas, funciona pro que o filme pede. Também no elenco, Georgina Campbell, Olwen Fouéré e Oliver Finnegan. Um comentário que não tenho certeza se foi ou não proposital, mas… A protagonista se chama Mina, e sua irmã é Lucy. Duas personagens do livro Dracula, de Bram Stoker. Coincidência?

Mesmo assim, gostei da estreia da Ishana. Apesar dos problemas, Os Observadores não é um filme ruim. Só poderia ser melhor. Aguardemos seu novo projeto.

Instinto Materno

Crítica – Instinto Materno

Sinopse (imdb): A vida aparentemente perfeita das amigas Alice e Celine desmorona após um acidente envolvendo um de seus filhos. O que começa como uma tragédia inimaginável acaba transformando a amizade entre elas em um jogo de segredos e mentiras.

O trailer vendia Instinto Materno como um suspense psicológico. Mas o resultado final ficou devendo.

Estreia na direção de Benoît Delhomme, Instinto Materno (Mothers’ Instinct, no original) é a refilmagem de Duelles, filme belga de 2018. Não vi o original, não sei se lá temos algo a mais. Normalmente, os originais europeus são melhores. Mas acredito que seja melhor, ano passado um amigo que mora na Europa tinha me recomendado esse Duelles, mas não achei onde ver aqui.

Acho que são os anos 60, tem um diálogo onde falam dos presidentes americanos, pra situar o espectador sobre qual ano o filme se passa, mas como não entendo de presidentes americanos, não sei qual ano. Enfim, duas famílias, vizinhas, muito amigas. As duas mulheres são amigas, e os filhos, de idades parecidas, são inseparáveis. Mas acontece uma fatalidade e isso abala a amizade.

A gente passa o filme todo pensando quando algo vai sacudir a trama. Um plot twist, uma grande revelação, algo bombástico. Mas nada. O filme é linear, tudo o que acontece é o que aconteceria numa vida normal. Ou seja, o filme acaba sendo chato.

Ok, temos duas grandes atrizes, Anne Hathaway e Jessica Chastain, e ambas estão bem. Mas, nenhuma atuação memorável. Filme linear com atuações lineares.

Quem foi a sessão de imprensa ganhou o livro que deu origem ao filme, e avisaram que a continuação do livro está para ser lançada em breve. Ou seja, o filme deve ter continuação. Mas, boa notícia: a história fecha, não deixa nenhuma ponta solta a ser resolvida num filme que a gente nem sabe se vai existir.

No fim, Instinto Materno não é ruim, mas é decepcionante porque tem cara de telefilme.

O Mundo Depois de Nós

Crítica – O Mundo Depois de Nós

Sinopse (imdb): As férias de uma família numa casa luxuosa sofrem uma reviravolta quando um ciberataque afeta todos os dispositivos e duas pessoas estranhas batem à porta.

Filme novo da Netflix, todo mundo está vendo e comentando, fiquei curioso quando vi que alguns canais de cinema que acompanho falavam do final, fui ver o filme pra saber por que o final está envolto em polêmicas.

Simples: PORQUE O FILME NÃO TEM FINAL! Simplesmente sobem os créditos e acabou.

¬¬

O pior é que heu estava gostando muito do filme. Mas um “final” desses me tirou do sério. Então, vou comentar o filme, depois comento sobre o encerramento.

Escrito e dirigido por Sam Esmail, adaptação do livro homônimo escrito por Rumaan Alan (que também colaborou no roteiro), O Mundo Depois de Nós (Leave the World Behind, no original) mostra uma família que tirou uns dias de férias em uma casa alugada, quando algo acontece no mundo e eles ficam isolados. Os supostos reais donos da casa aparecem e isso só serve pra aumentar a desconfiança geral sobre o que está acontecendo.

O ritmo do filme é muito bom. O espectador é envolvido num clima crescente de tensão, não sabemos o que está acontecendo. A trama te prende, é daquele tipo de filme que é difícil pausar, são pouco mais de duas horas que passam rapidinho.

Gostei muito da câmera do Sam Esmail – sei que ele é um dos nomes por trás da série Mr Robot, mas nunca vi a série, nunca tinha visto nada dele. Em vários momentos a câmera sai do eixo, roda, sobe, mostra muitos ângulos fora do convencional. Um exemplo: tem uma cena numa cabana onde a câmera roda, sobe e sai por uma fresta no telhado, pra mostrar o que está acontecendo fora da cabana.

Algumas sequências são muito bem filmadas, como a sequência do Tesla. Ok, provavelmente é um plano sequência fake, cheio de cgi, mas mesmo assim ficou bem legal.

Ah, e pra quem gosta de mensagens subliminares, reparem que o quadro abstrato na sala muda ao longo do filme. O mesmo acontece com a pintura atrás da cama de casal. E tem uma cena onde tem um quadro atrás da Julia Roberts mostrando uma imagem parecida com o que o Ethan Hawke tinha passado há pouco.

O elenco também manda bem. Julia Roberts, Mahershala Ali e Ethan Hawke estão muito bem nos seus papeis, assim como os outros três mais novos e mais desconhecidos, Charlie Evans, Farrah Mackenzie e Myha’la. E já tinha visto dezenas de filmes com Ethan Hawke e com Kevin Bacon e nunca tinha reparado como são parecidos!

Dá pra ver que heu estava gostando, né? Pois bem, hora de falar do “não final”.

Não tenho problemas com filmes com finais abertos. Usando como exemplo aquele que todos se lembram, Inception, no fim o pião está rodando, e a gente não sabe se aquilo é real ou sonho. A mesma coisa com O Vingador do Futuro do Verhoeven, ao fim do filme a gente não sabe se aquilo aconteceu ou se foi uma memória implantada. A gente nunca soube o que tinha na mala do Marsellus Wallace em Pulp Fiction. E a lista é infinita. O espectador não precisa de tudo mastigado.

Agora, se um filme se propõe a contar uma história, é bom que tenha algum tipo de conclusão. Reclamei aqui no heuvi este ano de dois filmes que terminaram abruptamente para serem concluídos em continuações, Aranhaverso 2 e Velozes e Furiosos 10. Se é pra deixar gancho, tem que fazer como Missão Impossível 7, que fecha a missão que o personagem está fazendo, e deixa pontas soltas a serem resolvidas na continuação. O modo usado em Aranhaverso 2 e Velozes e Furiosos 10 foi péssimo, a narrativa foi muito mal construída.

Mas nada não é tão ruim que não possa piorar. O Mundo Depois de Nós consegue ser ainda mais tosco, porque interrompe o filme do nada. E não li nada sobre uma continuação pra fechar a história. Me parece que os realizadores quiseram trollar o público. “Sabe a personagem frustrada porque não viu o final de Friends? Poizé, agora o espectador vai ficar igualmente frustrado por não ver o final do filme!”

Pena. Heu estava realmente gostando do filme. Mas esse “não final” foi uma ducha de água fria.

A Noite das Bruxas

Crítica – A Noite das Bruxas

Sinopse (imdb): Na Veneza pós-Segunda Guerra Mundial, Poirot, agora aposentado e vivendo em seu próprio exílio, relutantemente vai a uma sessão espírita. Mas quando um dos convidados é assassinado, cabe ao ex-detetive descobrir mais uma vez o assassino.

Terceiro filme do Kenneth Branagh como Hercule Poirot. Branagh dirige e estrela cada um deles. Mas não são continuações, cada um é baseado em um livro diferente da Agatha Christie. A única coisa em comum é o protagonista.

Tive um problema com o primeiro filme, Assassinato no Expresso Oriente, porque me lembrava do final, lembrava justamente quem é o assassino, então metade do filme perdeu a graça. E o segundo filme, Morte no Nilo, não é tão bom, tem alguns problemas no seu desenvolvimento. Posso dizer que, dos três, gostei mais deste terceiro.

A Noite das Bruxas (A Haunting in Venice, no original) foi baseado no livro Hallowe’en Party, que nunca tinha sido adaptado para o cinema, apenas para a tv. A trama foi trazida do Reino Unido para Veneza. E, apesar do nome sugerir, A Noite das Bruxas não é terror. Mas tem alguns jump scares!

A trama desenvolve bem o whodunit*. Todos os personagens estão fechados dentro de uma casa enorme, isolados porque a chuva fez os canais transbordarem. Acontece um assassinato e Poirot precisa investigar. Claro, ao longo da trama descobrimos que todos têm motivo para terem cometido o crime.

Branagh combinou com a equipe técnica de não avisar ao elenco quando luzes piscavam ou portas batiam. Algumas das reações no filme são legítimas!

A fotografia é muito boa e sabe aproveitar bem as paisagens de Veneza e a mansão onde se passa o whodunit. A boa trilha sonora de Hildur Guðnadóttir (que ganhou o Oscar pela trilha de Coringa) ajuda a criar o clima.

No elenco, Kenneth Branagh manda bem como era de se esperar. Digo mais: seu Hercule Poirot está meio confuso ao longo da projeção, e ao fim do filme a gente descobre por que. Gostei da personagem da Tina Fey, gosto da atriz, gosto do nome “Ariadne”, e gostei de como a personagem tem camadas diferentes. O grande elenco também conta com Michelle Yeoh, Jamie Dornan, Kelly Reilly, Camille Cottin, Emma Laird, Kyle Allen, Ali Khan e Riccardo Scamarcio.

Noite das Bruxas é melhor que os dois filmes anteriores, mas o fato de ser um terceiro filme talvez afaste o público. E aí vai ficar a dúvida: será que Branagh aposentará o seu Poirot, ou será que veremos mais uma adaptação da Agatha Christie?

*Glossário: Whodunit é o estilo de história onde acontece um crime, a trama levanta vários suspeitos e o espectador é instigado a descobrir quem é o culpado.

Sem Ar

Crítica – Sem Ar

Sinopse (imdb): Duas irmãs vão mergulhar em um local lindo e remoto. Uma das irmãs é atingida por uma pedra, deixando-a presa 28 metros abaixo. Com níveis perigosamente baixos de oxigênio e temperaturas frias, cabe a sua irmã lutar por sua vida.

Preciso admitir que caí no bait do pôster, que fala “mais intenso que A Queda“. Gostei muito de A Queda, um filme pequeno e muito eficiente na sua proposta de criar tensão – o espectador fica realmente angustiado com o que pode acontecer com as duas no alto da torre!

Bem, Sem Ar (The Dive, no original) tem o mesmo formato: duas mulheres se veem presas em uma situação de vida ou morte, e precisam descobrir como saírem vivas. Mas, infelizmente, é bem mais fraco que A Queda.

Sem Ar é refilmagem do norueguês Além das Profundezas, de 2020. Não vi o original, não posso comparar. Mas uma coisa posso dizer sobre esta nova versão: um dos problemas é a falta de história, e parece que existia uma preocupação em chegar a uma hora e meia (o filme tem exatas uma hora e trinta e um minutos). Como não tem muito o que contar, o filme fica enrolando com uns flashbacks rasos e imagens das personagens em sofrimento. Se é pra entrar nos flashbacks, o melhor seria aprofundar isso; ou então cortar 15 minutos do filme e entregar um filme mais enxuto de uma hora e quinze.

Tive um problema, não sei se fui o único. Mas não entendi por que as pedras de repente começaram a despencar. Não entendo nada de mergulho, é normal pedras caírem repentinamente? Achei que o roteiro podia ter explicado o motivo.

Pelo menos o visual das sequências subaquáticas é muito bonito, e as duas atrizes, Louisa Krause e Sophie Lowe, estão bem. Mas é pouco, o resultado final fica devendo. Sem Ar não é exatamente um filme ruim, mas vai decepcionar quem esperava algo do nível de A Queda.